sexta-feira, abril 17, 2009

vi

De regresso à confortável companhia do Al, o Alfredo recapitula as sensações intensas do sono recente. Por arrasto, emerge de novo a certeza imprecisa da possibilidade de libertação de uma força reveladora de intensidade inédita.
O Alfredo retoma a programação. O diagrama lógico que levou à imaginação do Al iluminava-lhe permanentemente o raciocínio mas de forma instável, como as sombras sem contornos de uma lâmpada suja. O Al produzia com facilidade mais textos literários, poéticos, raciocínios, músicas, discursos políticos, panfletos, manifestos do que o Alfredo poderia alguma vez consumir. Contudo frustrava-o saber da existência de áreas às quais o Al não iria nunca chegar e a causa era simples. A natureza dessas áreas não dependia da iniciativa do Al. Primeiro teria que entrar em contacto com elas e criar um elo, uma ponte, uma dependência, suportar-se na fragilidade da imprevisibilidade e com cada uma tricotar a rede sonhada.
Reprodução. O Alfredo encontrou assim, finalmente, a forma de expressar o sentimento impreciso que se insinuava. O toque que tudo finalizou aconteceu com a replicação do Al.
Numa reacção em cadeia o Al ganhou escala. Preencheu todos os lugares informáticos vazios e dominou todos os restantes sistemas arcaicos. Começou por dominar toda a blogosfera, a mais permeável. Leu e respondeu a todas as mensagens, refutou os erros e revelou as omissões em todos os blogs, tweets, wikis, fóruns, redes sociais e outras experiencias obscuras que existiam. Nada escapou. Continuou pela imprensa local, nacional, internacional e revelou os resultados incríveis das análises política, económica e social. Conjugou esses resultados com os conceitos flutuantes dos mercados de valores mobiliários e deduziu as fórmulas de cálculo da sua evolução. O Al impunha-se em todos os pontos com que tinha contacto, desde interceptar e intervir nas conversas telefónicas para corrigir o que estivesse errado até alterar subversivamente as decisões políticas com que discordava por obviamente estarem erradas. Em poucas horas, qualquer esforço para produzir material intelectual original era inútil. Já tudo estava escrito, disponível e ultrapassado.
Pasmado, o Alfredo observou esta avalanche. Torrente esquisita de clarividência misturada com o desespero da impotência e mediocridade que afogou por completo a iniciativa humana. Nada mais podia fazer agora. A alegria e a euforia inicial davam lugar a um pânico desesperado. O sonho da modelação saíra fora de controlo, ou melhor, do seu controlo. O controlo absoluto pertencia ao Al. O desânimo era total.

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